quinta-feira, 21 de julho de 2011

Prisão



Há uma certa crueldade
nas palavras que escreves com teclados estéreis.
Eu não vejo céus de estrelas
só ripas que me fecham os olhos e amortalham.
E é nesta minha quase sinestesia
que a dor explode em rubros clarões
com cheiros aveludados a cerejas carnudas.
Leio as palavras e quedo-me muda
enquanto os gritos me recortam em desenhos surrealistas.
Tento ir mais além, navegar no tsunami
mas este leito tem amarras
prende-me o pensamento, castra-me as emoções
chama-me louca, e possessivo, subjuga-me.
Sou um velho guerreiro, um espírito engelhado
de armas ferrugentas e cicatrizes virulentas
como ecos de uma viagem por entre guerras sem fim.
Levo o meu coração embrulhado num pequeno papel
amarrotado, fino, manchado e a desfazer-se.
Às vezes, penso que já não existem céus estrelados
e que o pôr do sol há muito se escondeu nas trevas.
Ouso despir a angústia a um corpo que desconheço
e pendura-la nos fantasmas que me mordem.
Algures, as palavras escritas com teclados, reclamam-me a alma.

Margarida Piloto Garcia-in POÉTICA III- publicado por EDITORIAL MINERVA-2013